Um morto, apenas
Hoje comecei o dia com um morto. Já tínhamos deixado os miúdos no colégio, íamos no carro a ouvir o Tubo de Ensaio, do Bruno Nogueira, na TSF. E, de repente, lá estava. Um carro da polícia de intervenção, muita gente, umas fitas a isolar um espaço e, nesse espaço, estendido no chão, um morto. E, em redor, muitas pessoas. Umas com sobrolho carregado, outras rindo alegremente, como se assistissem apenas a mais um episódio do C.S.I.
Mas o que mais me perturbou foi o modo displicente como a polícia cobriu o morto. Um daqueles lençóis azuis tapava-lhe a cara, mas uma poça de sangue que lhe saía da cabeça estava ali, à vista de todos. E os fulanos conversavam alegremente, ao lado do falecido, sem notar nos olhos grandes de um miúdo, fixos no corpo pousado no chão, imóveis no vermelho que manchava a calçada portuguesa.
Entre o espanto do menino e os sorrisos de polícias e transeuntes pode medir-se a distância entre a ingenuidade da infância e a indiferença do mundo adulto. Ali estava um homem sem vida. O menino viu isso. Os outros não.
Mas o que mais me perturbou foi o modo displicente como a polícia cobriu o morto. Um daqueles lençóis azuis tapava-lhe a cara, mas uma poça de sangue que lhe saía da cabeça estava ali, à vista de todos. E os fulanos conversavam alegremente, ao lado do falecido, sem notar nos olhos grandes de um miúdo, fixos no corpo pousado no chão, imóveis no vermelho que manchava a calçada portuguesa.
Entre o espanto do menino e os sorrisos de polícias e transeuntes pode medir-se a distância entre a ingenuidade da infância e a indiferença do mundo adulto. Ali estava um homem sem vida. O menino viu isso. Os outros não.