O regresso
Ai filhos. Voltar custa. Não é nenhum drama, claro está, drama é não poder sequer ir de férias, drama é ter uma doença má, drama é todo um sem número de outras circunstâncias da vida a que vamos tentando escapar, uns com mais sucesso que outros. Mas, voltando ao tema, sim, voltar custa. A mim custa. A nós custa. Certa vez, queixando-me deste regresso (porque, quer queiramos quer não, vai sempre havendo assuntos recorrentes porque a vida, ela mesma, é cíclica e leva-nos a estas reflexões repetidas) alguém dizia que só tem esta dor do regresso quem não é feliz na vida de todos os dias. Aquilo deixou-me a pensar, confesso. Seria eu uma infeliz disfarçada? Seria ruim a minha vida de sempre, em comparação com a minha vida de férias? Depois de pensar no assunto concluí que discordava daquela opinião. As férias são períodos de tempo em que o próprio tempo parece parar. Nada mais importa, só mesmo os laços familiares que apertamos com mais força, e as experiências únicas que vivemos. No que me diz respeito, vivi numa espécie de bolha. Desta vez, não actualizei o blogue (só um post a explicar a ausência), removi as notificações do telemóvel, e até a areia fez por mim o que talvez não fosse capaz de fazer - entrou-me para o botão do som do telefone, mantendo-o sempre em silêncio. Não vi a maior parte das conversas de WhatsApp (e acho que vou manter as notificações desactivadas porque me fez tão bem), não respondi à maior parte das coisas, não vi emails, não quis saber. Alguns assuntos difíceis ficaram num arquivo do meu cérebro (aparecendo apenas nos sonhos, todas as noites o sono a trabalhar por mim aquilo que, conscientemente, durante o dia parecia não me ocorrer). Não tive dores de cabeça. Só uma, pequenina, resolvida rapidamente com um Aspegic. Dormi ao relento três noites, no sofá do mini-jardim da nossa casa. Li, não tanto quanto gostaria, mas até esse prazer foi feito devagar, sem voragem. Não tive a mínima preocupação com a dieta ou com o corpo ou com a alimentação saudável ou com o raio que parta tanta escravidão. Comi tudo o que me apeteceu. Bebi tudo o que me deu na gana. Sem contagem de calorias ou pesos na consciência. Tenho uma balança na casa do Algarve. Nunca sequer lhe cheguei perto. Não corri uma única vez. Levei ténis e roupa de corrida, mas nunca me apeteceu. E desta vez só fiz o que me apeteceu. Andei dentro de água com os meus filhos, livre e feliz, namorei com o meu marido, diverti-me com os meus amigos, saí da praia de noite. Estive rodeada de gente, como tanto gosto. Cada vez mais, sei que tenho mesmo prazer em viver com uma casa cheia. Chegámos a ser 8 pessoas a dormir lá em casa e foi o período melhor de todos. Recebemos visitas de amigos, afilhados, irmã, sobrinhos, primos. Fomos muitos na praia, muitos a jantar. Fomos mesmo felizes, caraças. Mesmo felizes. Se isso significa que no dia-a-dia não somos? Não, não significa. Significa apenas que está cada um para seu lado, que os afazeres nos afastam naturalmente, e que, quando nos reencontramos ao final do dia ou no fim-de-semana não estamos tão disponíveis uns para os outros como em férias. Temos tensões, conflitos, contas para pagar, assuntos pendentes. Temos, muitas vezes, a cabeça feita em papa. Falta-nos o tempo, a paciência, o sol, o calor, o vagar. Em férias temos tudo isso e muito mais. Bom regresso a quem acabou de regressar. Boas férias a quem ainda vai!