Do amor e da dor (e de como, ligados, podem criar algo para o qual não há ainda nome)
Ontem estive quase 12 horas numas filmagens, à espera da minha vez de intervir.
Levei o computador e aproveitei para trabalhar como uma moura.
Era suposto que a minha intervenção fosse às 13h mas a coisa derrapou e só aconteceu às 20.30.
Às 19h, estava eu em brasa, quando se sentou ao meu lado um homem. Começámos a falar. E, de repente, o meu final de dia transformou-se. Comecei por sentir o corpo tenso descontrair. A crispação virar embevecimento. Toda a minha postura deixou de ter ângulos e vértices, para se arredondar. Aquele homem contou-me uma história de amor. E dor. De uma dor tão funda e tão repetida que fez com que o amor se tornasse ainda maior do que o amor pode ser. Como se aquele homem tivesse descoberto uma nova forma de amor para a qual não existe, ainda, uma palavra. Aquele homem passou pelo inferno mas a forma como o descreveu fez com que o inferno se tornasse belo. Poesia pura. Emocionou-se, emocionou-me.
Às vezes até eu, que tenho tanta dificuldade em acreditar que os acasos possam ser mais do que isso, sou levada a crer que há encontros que talvez estejam destinados. Talvez eu tivesse de passar por aquelas horas de seca para conhecer aquela história. Para ser brindada com aquela beleza toda.
Acho que lhe vou pedir autorização para a contar aqui. Se bem que não creio que tenha a habilidade para a partilhar com a mesma emoção e candura. Seguramente não com o mesmo amor.