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Cocó na fralda

Cocó na Fralda

Peripécias, pilhérias e parvoíces de meia dúzia de alminhas (e um cão).

António Feio: 1954-2010


Hoje fui fazer uma caminhada, às 7.30 da manhã. A brisa fresca bateu-me nos cabelos, o sol recém-nascido no céu, a cidade quieta, ainda. E eu sem conseguir deixar de pensar que o António nunca mais vai sentir uma brisa assim, nos cabelos, nunca mais vai ver o sol nascer ou pôr-se. Não vai sentir o cheiro da maresia, nem a chuva a cair nas pálpebras e no nariz, nem assistir ao princípio do bulício de um dia de semana. O António não vai voltar a rir com os amigos, não vai ter dias sim e dias não, não vai abraçar aqueles de quem mais gosta.
E, ao mesmo tempo que caminhava, junto ao rio, foi-se-me formando um nó na garganta, tão grande. A minha agenda de jornalista começa a ficar demasiado cheia de gente que já não vai sentir nada disto. Tenho demasiados nomes na minha lista que não vão atender o telefone, se eu ligar para os seus números. Porém, não os apago. Sou incapaz de os apagar.
Envelhecer é isto. Ver morrer gente que crescemos a admirar, ver morrer aqueles que nos fizeram rir, aqueles que nos são próximos, os familiares, os amigos. Envelhecer é terrível por causa disso, também por causa disso.
Como dizia alguém (não me lembro quem, mas até acho que foi o Raúl Solnado, outro nome na minha agenda para quem não adianta ligar) "eu não tenho medo de morrer, tenho é pena". É isso mesmo. Tenho pena, tanta pena que tenhamos de morrer. Sobretudo quando acontece assim tão cedo, como aconteceu ao António Feio. 55 anos. Uma luta feroz contra um cancro feroz. Tenho muita pena. Viver é demasiado bom para que tenha de acabar. E digerir isto é a tarefa mais dura da minha vida.

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