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Cocó na fralda

Cocó na Fralda

Peripécias, pilhérias e parvoíces de meia dúzia de alminhas (e um cão).

Mateus, o rebaptizador

Hoje dormiram cá em casa três irmãos, amigos dos meus filhos todos (ou não fossem filhos de grandes amigos nossos). De manhã, antes de os levar a todos para o surf, estavam à mesa a tomar o pequeno-almoço quando a Mada perguntou ao Mateus:

- Como é que ele se chama? - apontando para um dos irmãos.

- Gonçalo.

- Boa! E ela? - direccionando o dedo para a Francisca.

Ele ficou a olhar para ela, com os olhos semicerrados. A Francisca decidiu ajudar:

- Ki...

- Kiwi!

Estivemos a rir até sair de casa. 

Clube de Leitura do Porto by MultiOpticas: foi na sexta-feira e houve... espíritos à solta

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Desta vez a leitura era livre, por isso acumularam-se sugestões de novos livros que vieram somar-se às sugestões de Lisboa, numa bola de neve literária que promete continuar, para desespero daqueles que, como eu, gostavam de conseguir ler este mundo e o outro. 

A Marta apareceu pela primeira vez, confessando que os filhos e a falta de tempo a têm roubado aos livros mas pode ser que o clube a traga de novo para junto das leituras, que tanta falta lhe fazem. Sendo assim trouxe um livro que já leu há algum tempo mas de que gostou mesmo muito: "O Czar do Amor e do Tecno", de Anthony Marra. "Passa-se na Rússia de Estaline, em 1937, e vai até à guerra da Tchechénia, com o comunismo sempre muito presente." 

A Anabela trouxe "A Balada de Adam Henry", de Ian McEwan. "Adam é um rapaz com leucemia e tem de fazer um tratamento que, posteriormente, irá requerer a realização de transfusões de sangue. Só que os pais são Testemunhas de Jeová e não o permitem. O hospital pede intervenção judicial e é toda a história em redor deste dilema moral, ético e religioso, e é muito interessante."

A Raquel leu "As Regras da Cortesia", de Amor Towles. "Passa-se em Nova Iorque, no final dos anos 30. É a história de uma rapariga de origens modestas, que partilha um quarto com outra rapariga, numa residência para mulheres. Uma noite vão até um clube de jazz, conhecem um homem da alta finança com quem travam amizade e o livro conta a história da introdução das duas raparigas modestas numa esfera social que não é a sua mas que, na América daquele tempo, podia passar a ser. O velho sonho americano e a respectiva mobilidade social, com todas as suas facetas. Gostei. Às vezes parecia um pouco inverosímil mas, de facto, a américa tem  - ou tinha - muito disto."

O Diogo falou-nos de "Escrito na Água", de Paula Hawkins. "Não achei particularmente bem escrito. Acho que a construção das personagens podia ter sido feita de uma forma mais profunda e a história podia ter sido melhor trabalhada." Em seguida, contou sobre "O Homem dos Sussurros", de Alex North. "É um livro que condensa vários géneros: ele é thriller, mas também tem um pouco de terror. É policial mas também se pode dizer que é um romance. O tema da paternidade é muito bem trabalhado, no sentido de como um pai sozinho se sente a educar um filho, com todas as dúvidas e receios... gostei muito e recomendo!" Os últimos dois livros que leu e de que falou eram infanto-juvenis (porque o Diogo tem um blogue onde fala de livros e, por isso, toca todos os géneros e targets: No Conforto dos Livros): "Tiro Certeiro", de Robert Muchamore e "O Príncipe Caspian" (o segundo das Crónicas de Narnia), de C.S. Lewis.

A Conceição mais uma vez fez-nos rir. Disse que andou à procura na estante do livro mais fininho que encontrou, porque tem estado com os netos e com pouco tempo livre para ler. Então, encontrou "Olhos de Cão Azul", um livro de Gabriel Garcia Marquez que se lembrava de ter lido havia muitos, muitos anos, e de não ter gostado. Na etiqueta, o preço: 1.610 escudos! Foi, de facto, há muito tempo. Então e desta vez? Gostou? "Não! Não gostei nada na mesma. Mas pronto, cumpri: li e posso dizer-vos que, apesar de ter escrito livros fantásticos, este não é nada bom. Pelo menos para mim!"

A Mariana leu "Só o Amor é Real", de Brian Weiss, um psiquiatra que passou a acreditar em reencarnação ao fazer hipnose aos seus pacientes. "Alguns doentes começaram a falar línguas que desconheciam, línguas antigas, que inclusivamente já tinham deixado de ser usadas, pelo que só podiam conhecer se tivessem vivido noutro tempo. Os relatos são impressionantes e fizeram-me pensar." Mariana também leu "O Jogo do Anjo", de Carlos Ruiz Zafon, que a cativou pelo brilhantismo da escrita. "É a história de um rapaz que tem uma infância difícil e cujo pai proibe de ler, para que não tenha ideias de prosseguir com os estudos, porque não há dinheiro para isso. Mas o rapaz lê às escondidas e, entretanto, com a morte do pai arranja um tutor que não só lhe permite ler como estudar. Torna-se escritor e faz livros por encomenda. Entretanto, há um homem que lhe faz uma encomenda muito interessante mas a história parece-lhe obscura e ele vai investigar... Gostei muito, não só da história como da escrita. Dava por mim a rir sozinha com a forma como ele descrevia as coisas." A Mariana, que é bastante eclética, leu também "A Casa de Charles Street", de Danielle Steel. 

Foi com o livro "Só o Amor é Real" e os relatos de vidas passadas que começaram as nossas conversas paralelas sobre espíritos. Uns acreditam, outros não, outros preferem manter-se na dúvida. Falámos do jogo do copo e de estranhas coincidências. E também da hipnose e do perigo de ser feita por quem não sabe muito do assunto (há relatos de pessoas que enlouqueceram e a Marta conhece muito bem um desses casos).

O Paulo e a Cristina vieram a convite da Cláudia e não trouxeram livros mas o Paulo aproveitou para falar do livro "A Horse Walks into a Bar", de David Grossman, um livro que o marcou muito. "O narrador recebe um convite para estar num determinado stand up e conta a história da sua vida. É - como muitos cómicos - uma pessoa amargurada e o livro é todo sobre esta euforia-disforia-espectáculo. Achei muito interessante toda essa montanha russa emocional e a reacção do público que está ali para rir." A Raquel também o leu e aproveitou para dizer que sentiu falta de um "grand finale" que o livro parecia prometer mas nunca chegou a cumprir.

A Cláudia leu "Uma Educação", de Tara Westover, um livro que é a biografia da autora, que nasceu e foi criada numa família mormon e que teve de romper com a família para poder ter aquilo que lhe faltava: educação (entre outras coisas, nomeadamente, acesso à Medicina, que os pais consideravam ser um dos instrumentos do diabo). O livro é impressionante e a caminhada da autora não deixa de surpreender quem lê (terminei agora de ler o meu e não podia concordar mais). Outro livro que leu foi "Ao Fechar a Porta", de B.A. Paris. Achou um thriller vibrante mas pareceu-lhe que as críticas prometiam mais do que o que o livro é. Por fim, relatou-nos como foi a leitura de "Só o Tempo Dirá", de Jeffrey Archer, o primeiro volume do sucesso mundial "As Crónicas de Clifton", a história de um jovem nos anos 20, que não conheceu o pai e a quem foi contada uma história sobre o pai que - vem a descobrir mais tarde - não corresponde à verdade". Cláudia gostou muito e recomenda.

A Sofia, que está de partida para uma acção de voluntariado na Índia, leu "A Fome", do jornalista Martin Caparrós. O livro analisa a origem da fome nas diferentes regiões do mundo, das mais pobres às mais ricas: Índia, Argentina, Sudão do Sul, Estados Unidos da América. "É um livro muito cru, em que não há paninhos quentes. Ele é directo, cru, violento, até. Não é um livro para ler, é um livro para ir lendo. E aprendendo muito."

A Lígia, que também foi uma estreante no Clube, leu imensos livros. "Jogos Cruéis", de Jodi Picoult. É a história de como uma paixoneta juvenil pode tramar a vida de um homem inocente, que se vê enredado numa série de mentiras que lhe custam a liberdade e a vida, pelo menos a vida tal como a conhecia. A Lígia também leu "A Avó que Percorreu o Mundo de Bicicleta", Gabri Ródenas, que é no fundo um livro de auto-ajuda, que procura dar algumas lições de ânimo, esperança e amor; "A Força do Amor", de Angela Hart (sobre famílias de acolhimento e a forma como crianças vítimas de abandono testam as novas famílias até ao limite do impossível, para se certificarem de que aquele amor é real); "Tu Sabes que Queres", de Kristen Roupenian, um livro de contos essencialmente sombrios.

O Pedro leu 84 páginas do livro "Nome de Guerra", de Almada Negreiros. "É a história de um miúdo da província que é mandado para a cidade para se fazer homem e que, no processo, conhece Judite, que é bem capaz de cumprir os propósitos de quem enviou o rapaz para a cidade." Pedro falou também de uma série (possivelmente responsável por não ter terminado o livro, este mês): Bonus Family. Uma série sueca que é uma espécie de novela mas... em muito, muito bom. 

A Joana trouxe-nos "O Tatuador de Auschwitz", de Heather Morris, o relato verdadeiro de Lale Sokolov, incumbido da tarefa de tatuar os prisioneiros em Auschwitz. Um dia, na fila para ser tatuada, Sokolov vê Gita e... foi amor à primeira vista. O livro conta então a determinação do tatuador em sobreviver, bem como em fazer sobreviver o amor da sua vida. Este romance é baseado em entrevistas que o autor fez ao longo de diveresos anos à Sokolov, vítima do Holocausto e tatuador em Auschwitz-Birkenau.

"A Paciente Silenciosa", de Alex Michaelides foi a leitura da Verónica. "De todos os thrillers que li até hoje, este foi sem dúvida o mais surpreendente de todos. Alicia é uma pintora famosa e o livro começa quando ela está numa instituição psiquiátrica onde só estão pessoas que cometeram crimes horríveis. Ela está nessa casa porque foi encontrada ao lado do marido morto com vários tiros e, portanto, é a principal suspeita. Ela nunca fala, nem sequer para se defender. Até que entra em cena um psicoterapeuta criminal que acredita ir conseguir fazê-la desvendar o mistério. Fui, ao longo do livro, imaginando desfechos mas o final é absolutamente surpreendente." Verónica também leu "Persuasão", o último romance de Jane Austen, e gostou muito. Por fim, leu "Entre as Mentiras", de Michelle Adams, que não lhe encheu as medidas: "Talvez por ter grandes expectativas não fiquei tão agradada quanto esperava. É a história de uma mulher que tem um acidente e perde a memória. Não se lembra de nada nem de ninguém mas sente que lhe escondem coisas."

A Sara leu "Crónica de Uma Morte Anunciada", de Gabriel Garcia Marquez: "Há um assassinato e do que mais gostei foi de perceber como cada pessoa da aldeia tem uma percepção totalmente distinta da mesma realidade. Porque é mesmo assim: a memória é aquilo que cada um é, aquilo que cada um quer que seja, aquilo que cada um traz. Achei muito curioso."

Eu li "29 Segundos", de T.M. Logan e é a história de uma mulher que é assediada pelo chefe, que é um porcalhão. Um dia ela tem a oportunidade de ver desaparecer uma pessoa de quem não goste. Basta-lhe fazer um telefonema, que dura apenas... 29 segundos. Li depressa, nos voos para as Maldivas, mas achei as críticas e as frases estrategicamente colocadas na badana da contra-capa do livro manifestamente exageradas ("Incrível! A sensação de impotência torna-se quase insuportável. Prepare-se para ranger os dentes e roer as unhas quase até ao amargo desenlace"). O outro livro que li foi "Os Homens que Odeiam as Mulheres", de Stieg Larsson. Como tendo a escapar às grandes modas, escapei desta saga durante muito tempo. Mas agora que comecei a trilogia de Larsson (entretanto transformada numa pentalogia, porque foi continuada por outro autor, uma vez que Stieg Larsson morreu subitamente, não tendo conhecido o retumbante sucesso que a sua obra teve em todo o mundo) vejo que devia ter começado mais cedo. Adorei este livro. É um thriller mas muito bem construído. As personagens são solidamente construídas, a teia de acontecimentos muito bem pensada, com todo um esquema de corrupção económica que exigiu investigação e conhecimento. Mesmo, mesmo bom.

 

Obrigada à MultiOpticas pelo extraordinário apoio. Batem forte cá dentro!

Obrigada ao Vila Galé Porto por nos acolher sempre tão bem!

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Sou madrinha... de um bolo

Quando me convidaram para ser madrinha de um bolo fiquei um bocado de cara à banda. Como assim? Madrinha de um bolo? Eu até já tenho 3 magníficos docinhos como afilhados mas um bolo ainda não constava no rol. Foi desta. Sou madrinha do Bolo de Tacho de Monchique, que é finalista distrital das 7 Maravilhas Doces de Portugal.

Sobre o bolo-afilhado: reza a história que foram os frades Franciscanos do Convento de Nossa Senhora do Desterro que, no século XVII, criaram este bolo usando produtos locais. Por inicialmente ir ao forno em tachos, passou a ser conhecido por Bolo de Tacho. Também é conhecido por Bolo de Milho ou Bolo de Maio por ser feito especialmente para o dia 1 de Maio (Dia do Trabalhador).

E agora o que gostava era que votassem no meu afilhado. Afinal, "quem meus filhos ama minha boca adoça", e o mesmo pode ser válido para os afilhados, que são filhos do coração. Além do mais, a parte do "minha boca adoça" não podia calhar melhor quando se é madrinha de... um bolo!

Para votar basta ligar: 760 107 134 (0,60€ + IVA). 

VAI BOLO DE TACHOOOOOOOOOOO!

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Chernobyl

Se andam à procura de uma boa série, podem ver esta (entre tantas, tantas outras). Chernobyl é uma série opressiva (da HBO) que sufoca, que angustia, que nos amachuca pelo cinzento, pela banda sonora que esmaga. Se preferem coisinhas leves e contentes não vejam. Mas se gostam de sentir o peso do que vêem, agravado pelo facto de ser uma história real (ainda que ficcionada), então vejam Chernobyl. Eu adorei. Senti a densidade no lombo mas adorei.

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A adolescência não é para meninos

Tenho tido muita sorte com as adolescências cá de casa. Além de respostas tortas (devidamente cortadas com olhares fulminantes ou repreensões certeiras) e uma ou outra parvoíce sem importância tem sido muito fácil e até divertido assistir ao crescimento desta malta. Lembro-me de me exasperar com o poder de argumentação do Manel, que me levava a querer estrangulá-lo (só por segundos, calma), e de achar enervante o tempo que passava ao telefone com a namorada e do certo ar de enfado que punha quando se tratava de nos oferecer algum do seu precioso tempo, mas tirando isso... tudo na maior.

O Martim tem sido uma paz de alma. Não é propriamente um fã de escola e de estudo (também me lembro de não ser assim a minha coisa preferida do mundo) mas tem cumprido, com a minha ajuda, porque tenho sempre sentido que lhe sou útil e que, sem algum apoio, se perde em distracções. Este ano, decidi não ajudar. Disse-lhe que estava crescido e que era chegada a hora de voar sozinho. O primeiro período correu tão bem que respirei fundo.  Boas notas, impecável. "Ufff! Estava tão farta de estudar, caraças. Estou livre!", pensei. Só que o tempo foi passando e a sua dedicação ao estudo foi caindo como se fosse o caudal de um rio ao chegar a uma catarata. Sempre que se lhe perguntava se já tinha feito os trabalhos a resposta era "já". Sempre que se lhe perguntava se já tinha estudado a sua resposta era "sim". Sabia sempre tudo. Estava sempre tudo bem. Fui assistindo e pensei: "Eu até posso agarrá-lo já mas... vou ver no que isto dá." Deixei-o cair de propósito. Afinal, quantas vezes é nas quedas que mais aprendemos? No meio do processo, fomos chamados à escola, queriam saber se havia alguma alteração alguma coisa de que não estivessem a par. A derrapagem era evidente, as notas no final do período tiveram o efeito do caudal do rio a despencar no fim da catarata (do Iguaçu). 

A conversa, nesse final de período, foi clara: eu estou e empenho-me se tu estiveres e te empenhares. Se não te quiseres empenhar desistimos já os dois. Baixamos os braços. Entregamos os pontos. Ele comprometeu-se. E cumpriu. Estudámos para caraças. Quem me acompanha no Instagram viu os stories com o estudo, viu quando pedi fichas e testes, houve quem enviasse muito material, PDFs, vídeos, exercícios. Muito, muito, muito obrigada a todos. O Martim passou o Cabo das Tormentas e rebaptizou-o de Cabo da Boa Esperança. Com ajuda? Sim. Por que não? Devia tê-lo deixado chumbar o ano? Aprender à sua custa? Ficar para trás quando a única coisa que o travou foi a sua imaturidade? Quando tinha os professores a dizerem que ele era um miúdo muito participativo nas aulas, interessado, e que nem queriam acreditar nos resultados dos testes? Devia ter continuado impávida, ou oferecer a minha ajuda, depois do susto? A resposta para mim foi evidente. E será sempre evidente. Quis que aprendesse, que levasse um susto, mas que depois conseguisse, com o seu esforço, reverter a situação.

Creio que levou com ele uma lição importante para a vida: sem trabalho... poucos são os que conseguem (que também os há, raio dos bichos). E levou outra: com trabalho, árduo, sério, consistente... só alguns não chegam lá. E ele chegou, com algumas notas verdadeiramente impressionantes (para quem tinha feito o disparate que ele fez). A recuperação foi notável mas não foi um milagre. Foi apenas e só trabalho. A adolescência também nos prega partidas destas. Não é nenhum bicho de sete cabeças nem tem de ser um tabu ou uma vergonha. São percalços. A vida está cheia deles. Há os que sucumbem e há os que lutam. É bom quando se luta e, no final, se vence. Parabéns, Martim. 

 

É tão certo como dois e dois serem quatro

Todos os anos este post vê a luz do dia e verá por mais uns anos, enquanto tiver filhos em idade de fazerem campos de férias. Sim, vou falar do Sniper, o campo de férias para onde os meus filhos vão todos os anos uma semana. Não por ser uma borla, que não é, mas porque eles merecem cada linha. Este ano o Manel já não foi (já no ano passado não tinha ido) porque está a estudar para um exame que ditará a entrada na universidade. Além disso, começa já a ter a sua própria agenda com os amigos, e é natural que queira experimentar coisas novas. O Martim foi muuuuuito contrariado. Não porque não goste de ir mas porque está a viver uma fase em que tudo é uma contrariedade. Tudo menos passar horas a jogar, claro está. Mas o nosso papel de pais é justamente contrariar a tendência para a inércia e para a total imersão no mundo electrónico. Mal estaria eu da cabeça se cedesse ao "não quero ir, estou farto, vou todos os anos". Está bem, abelha, o que tu queres sei eu. Foi. Ele e a Mada. E o Mateus só não teve guia de marcha porque ainda não tem idade (é a partir dos 6 anos).

Não há experiência melhor para as crianças do que um campo de férias. Fazem amizades, praticam uma série de actividades espectaculares, divertem-se ao ar livre, longe dos telemóveis (que são permitidos apenas meia hora por dia) e dos computadores (que não existem). Eles sujam-se, ganham autonomia, entre-ajudam-se. Aprendem a lidar com pessoas diferentes, com educações diferentes e pancadas parecidas mas também distintas das suas. Constroem, caminham, dormem no meio da serra. Fazem escalada, rapel, slide, atravessam um rio a caminhar (com água pelo pescoço, os mais pequenos, pela cintura os mais crescidos), vão a uma gruta, caminham quilómetros até chegarem ao local da serra onde constroem um abrigo para pernoitar. Jogam matraquilhos humanos, paintball, fazem karaoke... eu sei lá. São tantas actividades que nem sei se me lembro de todas. A liderar tudo isto está o Nuno Avelar de Sousa que sabe mais sobre a cabeça da miudagem a dormir do que a maioria de nós acordados. Que aproveita para conversar com alguns sobre a vida, sobre as dúvidas e angústias e revoltas que alguns manifestam (ou mesmo que não manifestem ele lá encontra maneira de as descobrir e lidar com elas).

No primeiro dia que falei com o Martim ao telefone falou emburrado, como se estivesse preso ou coisa que o valha. Depois? Depois já era só alegria. No final perguntei se valeu a pena. Que sim. Claro que sim. Por isso é que quando me dizem "O meu filho não vai porque não quer" penso que é pena que não vão na mesma. Às vezes - a maioria - temos de sair do nosso ambiente, onde nos sentimos seguros e confiantes, para descobrir novas aventuras que nos fazem mesmo bem. Às vezes custa. Não apetece. Mete medo, esse desconhecido. Rejeitamo-lo porque tudo o que não conhecemos nos traz uma certa insegurança. Mas depois... Depois é quase sempre o melhor que podíamos ter feito.

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Clube de leitura de Lisboa: foi na semana passada (uma delícia, como sempre). Clube de Leitura do Porto: é esta sexta!

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O encontro do Clube de Leitura de Lisboa foi na semana passada, excepcionalmente a uma quinta-feira porque a Mada fazia anos na sexta. E saí de lá com muita vontade de ler mais uma série de livros. A começar pelo "As Flores Perdidas de Alice Hart", de Holly Ringland. Foi a Beatriz Couto quem o leu e mostrou-se encantada com a beleza do livro: "É a história de um pai violento e de uma criança e a mãe, que vivem isoladas em casa, submissas a este homem. Um dia a criança provoca um acidente que muda tudo. Deixa de falar, vai viver com uma avó que cria flores nativas e as duas começam a comunicar através das flores. Achei lindo do princípio ao fim. Muito bonito mesmo."

Além deste, a Beatriz também leu "O Grande Golpe", de John Grisham. Trata da terrível realidade dos empréstimos que os estudantes universitários nos EUA têm que contrair, de faculdades com métodos pouco sérios (para não dizer mafiosos), e da solução encontrada por um grupo de alunos desesperados. 

Pegando no livro que a Beatriz está neste momento a ler, "A Grande Solidão", de Kristin Hannah, saltamos para a Cristina, que já o leu. Um livro sobre a solidão em que se pode viver, mesmo acompanhado. Sobre os fantasmas que moram dentro de um ex-combatente do Vietnam, sobre como é conviver com alguém preso no passado e sobre a prisão dos amores doentios. A Cristina também leu "Comunidade", de Ann Parchett, e acabou a emprestar-me o livro "Eu Não lhe Disse que Estava a Escrever este Livro", de Nadine Vasseur, porque fiquei imediatamente rendida ao tema: são os testemunhos de filhos de sobreviventes do Holocausto. Como foi ser filho de pessoas que passaram por aquilo que os pais passaram? Que consequências teve, no seu crescimento, o facto de serem filhos de quem viveu o impossível? Já cá mora, emprestado, mas ainda não li.

A Sara também leu "O Grande Golpe", de Grisham (e, a propósito, a Elisabete recomenda muito outros dois livros dele: "O Sócio" e "A Firma") e ficou muito impressionada com o beco sem saída em que alguns estudantes americanos ficam, encurralados pelos créditos para poderem estudar.

A Susana foi ao Clube pela primeira vez e levou um clássico: "O Poder e a Glória", de Graham Greene. Um livro sobre as perseguições religiosas da Guerra Cristera, no México da primeira metade do século XX. "Gosto muito de livros que nos trazem pedaços da História, embrulhados com ficção. Este livro é muito interessante porque além de nos relatar acontecimentos reais, está muitíssimo bem escrito e é envolvente." Isabel Sobrinho aproveita para relembrar um outro livrro de Graham Greene de que gostou muito, "Empresta-nos o seu Marido?". A Susana diz também que leu recentemente "A Rapariga que Roubava Livros", de Markus Zusak, e que se deliciou. "É a história de uma garota adoptada por uma família de alemães, numa terra perto de Munique, e está muito bem escrito, entrelaçado de histórias, e ficamos a saber coisas daquela altura. É muito interessante. Uma ternura." Outra das suas leituras recentes foi "Os Despojos do Dia", de Kazuo Ishiguro, (um dos livros que todos lemos no clube há uns meses): "Percebe-se a teia política entre a 1ª guerra e o Tratado de Versailles e fala também de obediência, dever, rigor."

A Beatriz Mendes leu o "Manual de Escrita Criativa", de João Mancelos mas não adorou. O mesmo não se pode dizer de "O Mundo à Beira de Um Ataque de Nervos", de Matt Haig, sobre a ansiedade que as redes sociais nos criam, sobre olhar para o lado e ver que não sei quem tem algo que não temos, atingiu um objectivo que não atingimos e toda a pressão que isso nos causa. "São demasiados estímulos a que nos sujeitamos. Passamos a vida a olhar para o melhor de cada um. E é importante desligar, criar espaço para o descanso, para a serenidade."

Além destes dois, a Beatriz leu "Little Fires Everywhere" (traduzido para Portugal como "Pequenos Fogos em Todo o Lado"), de Celeste Ng: "São duas famílias muitos diferentes: uma muito tradicional, outra é uma mãe solteira, fotógrafa, e uma filha adolescente. E esta mãe solteira vai viver para esta comunidade em que todos são perfeitos, bem sucedidos, bons...  claro que ela vai causar ali algum impacto. Enfim, não me adianto mais, só digo que toda a gente tem de ler este livro. Dei por mim a subir uma calçada íngreme e a ler sem conseguir parar. É maravilhoso."

Por fim, a Beatriz também leu um livro que fiquei com vontade de ler (assim como o anterior): "The Year of Magical Thinking" ("O Ano do Pensamento Mágico), de Joan Didion. É a história verdadeira do amor entre a autora e o seu marido, também escritor, que morreu subitamente. O livro foi escrito durante um ano, desde o seu desaparecimento abrupto, e é uma partilha íntima de uma vida em comum e fala da ausência, da volatilidade, do estar agora e deixar de estar no minuto seguinte, com tudo o que isso implica. 

A Isabel Sobrinho leu "Receitas com Paixão", de Márcia Soares Gonçalves, porque gosta de livros bonitos e de receitas, mas fica sempre com a ideia de que são receitas para quem não chega a casa tarde e más horas e tem filhos pequenos. Depois, está a ler "O Cérebro da Criança: 12 estratégias revolucionárias para nutrir a mente em desenvolvimento do seu filho e ajudar a sua família a prosperar", de Daniel J. Siegel e Tina Payne Bryson. "Gosto de saber mais sobre o cérebro e de aprender estratégias para ajudar as minhas filhas a usarem-no da melhor maneira. Além disso, tenho uma filha que me desafia todos os dias e ando sempre à procura de soluções para melhor lidar com ela".

A Luísa leu "Eliete", de Dulce Maria Cardoso, seguindo os múltiplos conselhos de todos nós, e gostou. E leu Caim, de José Saramago, para concluir que o escritor era mais que ateu, parecia ser mesmo revoltado contra Deus e a religião.

A Elisabete trouxe-nos "Liberdade", de Jonathan Franzen, e disse maravilhas. "Irritou-me um bocadinho o final mas é muito bom mesmo."

 

Obrigada, uma vez mais, ao Brown's Hotel por nos receber sempre tão bem. 

E, claro, obrigada à MultiOpticas por apoiar a leitura e por apoiar estes nossos encontros.

O Clube de Leitura no Porto é já esta sexta-feira, dia 5 de Julho, às 19h, no Vila Galé Porto! Lá vos espero! (a leitura é livre)

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Mudar de Vida #18: Bárbara Alves da Costa

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Foto: Paulo Miguel Martins 

 

Não seria estranho se a víssemos chegar montada num cavalo bravo, sem sela ou arreios, domando o bicho apenas com a força da sua natureza. Vendo-a ali, no campo, a conversar com a dona Gertrudes, a caminhar pelas ervas altas, apontando para os limites do terreno, fica difícil acreditar que nasceu em Lisboa, que foi jornalista, que teve outra vida antes desta, que lhe parece colada ao corpo, à alma, à existência inteira. 

Bárbara Alves da Costa tem 44 anos e é a prova de que todos podemos ser muitas coisas, muito mais do que uma só. Ela é cidade e informação e festas e amigos e viagens, mas também é campo e silêncio e contemplação e sossego. Talvez seja uma mistura de mãe, pai e avó. A mãe, nascida e criada na Avenida de Roma, sonhava com a vida no campo. O pai, nascido e criado no Areeiro, era urbano e "alucinado", baterista da banda "Jets", jornalista de investigação. A avó Corina (mãe do pai) era toda fantasia, amor e viagens pelo mundo inteiro. Lia histórias sentada no chão, acreditava que o mundo era mágico e garantia aos netos que tudo era possível, bastava acreditar. Acreditar e dar: "Quanto mais dás, mais recebes", era um dos seus lemas.

É neste caldo que Bárbara cresce, entre a realidade e a imaginação, entre Lisboa, Cascais e o mundo. Talvez por influência do pai (cresceu a vê-lo investigar temas como a droga ou a prostituição), estuda Comunicação e Marketing no ISCEM e, em 1995, vai para Nova Iorque fazer um ano (Marymount Manhattan College). Chegou em Setembro e em Dezembro levou o seu currículo à MTV da Broadway. Em Janeiro começava um estágio na MTV Latino News. "Se acreditares, tudo é possível", dizia-lhe a avó desde sempre. E mesmo longe, com um oceano entre elas, Bárbara conseguia ouvir aquela frase, tantas vezes repetida, como um mantra. Foi assim que, sem pensar duas vezes, foi entregar o currículo à ABC mal terminou o estágio na MTV. E, como se fosse uma das magias de que a avó lhe falava, começou a trabalhar no Good Morning America. 

Foi um ano do caraças. Não há adjectivo melhor. Foi do caraças mesmo. "Fui com três amigas da universidade e vivemos um ano em Nova Iorque. Dá para imaginar?" No final do ano, Bárbara recebeu uma proposta para ficar a trabalhar na MTV e não aceitou: "Sou Caranguejo e a família e os amigos são muito importantes. Não quis ficar. Voltei para Lisboa, terminei o ISCEM, fiz o Cenjor. Estagiei na LUSA, no Público e na TVI. Entretanto, uma das minhas melhores amigas manda o meu currículo para o CNL (Canal de Notícias de Lisboa) e eu vou abrir o CNL e fico lá até ao fim. Nessa altura, éramos um grupo de amigos todos a viver no mesmo prédio, em Xabregas. Foi épico. Quando aquilo acaba, o Nuno Santos vai-me lá buscar para o arranque da SIC Notícias."

Namorou com um jornalista da SIC e, depois de 3 anos a viverem juntos, casaram durante uma reportagem em Las Vegas. Estavam juntos havia 5 anos quando nasceu a Maria do Mar. Separaram-se pouco depois. Ficaram amigos mas a convivência já não era possível. Esteve três anos sozinha, viveu com a irmã, não quis envolvimentos apressados para colmatar algum vazio, até porque, com ela, há poucas hipóteses de nascer qualquer vazio. Entretanto, reencontrou um ex-namorado (de quando tinha 17 anos). O Pedro. Ele com um filho de três anos, ela com uma filha de três anos (tinham apenas 1 mês de diferença). "Durante um tempo íamos a casa um do outro sem que os miúdos nos vissem. Aproveitávamos quando eles já estavam a dormir. Não queríamos precipitar nada. Quando decidimos viver juntos foi o caos. Fomos para casa dele, que tinha dois quartos. Os miúdos começaram a dar-se como cão e gato. Dividiam o quarto como se fossem territórios inimigos. "Não passas em cima do tapete porque este lado é meu!" Foi um início muito duro. Quis acabar com aquilo, sugeri que vivesse cada um na sua casa mas o Pedro protestou. Dizia que isso não era uma família. Lutámos imenso para que os miúdos ultrapassassem o facto de terem deixado de ser filhos únicos. Estamos juntos há 10 anos mas os primeiros 4 foram mesmo uma prova de fogo. Quando íamos de férias todos juntos era um tormento. Só pensava: porquê?? Porque é que insistimos nisto? Depois íamos de férias os dois, para compensar."

Há 8 anos, Bárbara e Pedro compraram um monte no Alentejo. Tinha uma casa e umas ruínas e a ideia era terem ali um refúgio para os fins-de-semana e as férias. Sempre que iam para lá, a filha de Bárbara e o filho de Pedro davam-se bem. Havia espaço, muito espaço, e a liberdade tinha em ambos um efeito apaziguador. Era o lugar onde tudo corria bem, a uma hora e picos de Lisboa. Entretanto, Bárbara engravidou da Alice. Nesse ano, a sogra tinha um cancro, o sogro morreu com um cancro. A vida tornou-se mais triste e pesada, com tanta doença. Bárbara entrava todos os dias na SIC, em Carnaxide, às 8.30 da manhã. Saía cedíssimo de Cascais e levava a miúda ao colégio no Restelo. Não gostava de ser aquela mãe, o tipo de mãe que passa o dia inteiro longe da família. E estava grávida. Na SIC era feliz, claro, felicíssima a fazer reportagem. Mas sentiu que tinha de escolher. Um dia, ligou ao Pedro e disse: lhe: "Vou-me despedir." Ele, que a conhece de ginjeira e sabe que ela era mulher para isso, perguntou: "Hoje?" Ela gargalhou. "Hoje não. Mas prepara-te. Vamos fazer um Turismo Rural no monte. Vamos largar tudo e vamos viver para lá."

BAC.jpgFotos: Rita Ferro Alvim

 

Pedro, arquitecto de formação, começou a fazer contas sem ela saber. Um plano com pés e cabeça. Três meses depois do  telefonema em que ela o avisou de que se iria despedir, Bárbara pediu a demissão. Era Dezembro. Ainda tentaram candidatar-se aos fundos da União Europeia mas já era tarde. Então, meteram-se numa formação de jovens agricultores para se poderem candidatar ao processo todo. Ela grávida de 8 meses, a subir e a descer de tractores. Entretanto, houve uma reabertura do fundo ao qual se tinham tentado candidatar. "Tinham sobrado uns dinheiros e tínhamos um mês para apresentar uma candidatura detalhada. Era preciso descrever tudo ao mais ínfimo detalhe: uma memória descritiva desde que o cliente entrasse até que saísse. Um dossier com três produtos para cada item de cada assoalhada. Ou seja: tínhamos de apresentar 3 orçamentos para candeeiros, 3 orçamentos para camas, para sofás, para mesas de cabeceira, três orçamentos para tudo! Tivemos uma conversa com os miúdos em que lhes explicámos que eles iam ter de se orientar muito sozinhos naquele mês. E falei com as minhas melhores amigas para nos ajudarem. Entregámos o dossier no último dia, nos CTT de Cabo Ruivo, que eram os correios que fechavam mais tarde. Dois meses depois recebemos uma carta a dizer que o projecto estava aprovado."

E agora? A palavra aprovado trouxe consigo o susto. Quase como se só perante a palavra "aprovado" tivesse acordado os dois sonhadores para o passo que estavam efectivamente a dar. As escolas. A filha dela num colégio, o filho dele noutro. E o resto? O mobiliário para o turismo, as obras, tudo. "Fui às arrecadações da minha mãe e das avós, minhas e do Pedro. Comprámos camas, algumas cadeiras, lençóis, toalhas, essas coisas de hotelaria, alguns candeeiros. Tudo o resto é das avós e bisavós. Ligámos para os amigos para nos ajudarem a montar tudo. Estivemos a trabalhar de manhã à noite sem electricidade, sem água quente. A Terra do Sempre existe com os amigos. Fizemos sempre tudo com os nossos melhores amigos."

Em Junho abriu com um quarto. Depois foi abrindo mais outro. E outro. Em Outubro

 

Mateus, o desmoralizador

- Sabes, a tia Nana está a ficar velhinha.

- A tia Nana??? A tia Nana não está nada a ficar velhinha! Porque é que dizes isso?

- Porque ela fez anos agora...

- Está bem, ela fez anos, mas quantos anos é que achas que a tia Nana fez?

- Hummm... para aí uns duzentos ou isso.

🙄

(a tia Nana tem... 34 anos. O Mateus vai ser daqueles que vai ter namoradas muuuuito mais novas, ou namorados, tipo sugar daddy).

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