Fica em Wavre, uma cidadezinha perto de Bruxelas, e é a maior fábrica de vacinas do mundo, com uma superfície equivalente a 70 estádios de futebol, e onde trabalham cerca de 9 mil pessoas. Inaugurada em 1995, esta fábrica da GSK produz mais de 40 tipos de vacinas para crianças, adolescentes, adultos e viajantes.
Cheguei na terça-feira à noite, tive um jantar com outros convidados de outros países da Europa (França, Croácia, Espanha, República Checa, Itália, Roménia, Áustria e Alemanha) e no dia seguinte às 8h da manhã estavam a levar-nos para este mega-edifício onde tantas e tantas vacinas são feitas para proteger os nossos filhos e para nos proteger a todos.
Fomos divididos em grupos, para irmos visitar a fábrica. E, pelo que nos foi explicado, esta é uma visita mesmo muito, muito exclusiva porque são raríssimas as pessoas (mesmo da própria empresa) que têm permissão para entrar naquele espaço muitíssimo controlado. O ar é filtrado, a humidade e a temperatura são controladas, tudo é esterilizado. Não pudemos levar telemóveis, nem cadernos e canetas para tirar notas, nem coisa nenhuma, de resto. Houve algumas bloggers que estavam claramente a fritar com o facto de terem de se separar dos seus telemóveis (é impressionante alguns níveis de dependência) mas que remédio, valores mais altos se levantavam.
Fomos então para uma sala e, o que se seguiu estava bem longe do que eu podia imaginar. Vamos lá ver: eu imaginei que uma fábrica deste género tivesse procedimentos de segurança apertados mas, como nunca dediquei muito tempo a pensar no assunto, nunca supus que pudesse ser assim.
Nessa primeira sala, tivemos de calçar uns "pezinhos" por cima dos sapatos mas tínhamos de o fazer em pleno ar. Havia uma risca encarnada: de um lado estávamos nós com os nossos sapatos da rua, bem conspurcados, do outro estava o começo da assepsia mais asséptica por onde já passei. Assim, nem o "pezinho" podia tocar no lado conspurcado da vida, nem o nosso sapato podia tocar no lado desinfectado da existência. E, por isso, era em pleno ar que devíamos tornar o nosso sapato digno de passar para a outra margem.
Depois, fomos para o vestiário. Descalçámos os sapatos com os respectivos "pezinhos" que os envolviam e ficámos de meias. Despimos a nossa roupa (ficámos em roupa interior) e vestimos uma camisola e umas calças azuis escuras. Metemos uma touca de rede que tinha de nos envolver todos os cabelos. Retirámos todo o tipo de acessórios: brincos, colares, fios, relógios, pulseiras, até a aliança de casamento. Em seguida, removemos a maquilhagem. E lavámos as mãos seguindo a técnica dos 6 passos. Quando terminámos sentia-me já uma cirurgiã e ainda perguntei se íamos abrir alguém (podiam ter-se esquecido de me avisar), mas não.
Passámos então para outra sala. Mas antes de passarmos, desinfectámos as mãos. De novo, uma fronteira a dividir a sala. Do lado de cá éramos ainda porquitas, do lado de lá começávamos a aproximar-nos da purificação e da possibilidade de entrar. Mais uma vez calcei, no ar, uma espécie de meias descartáveis por cima das minhas meias e só depois pude aterrar os pés do outro lado da fronteira. Seguiu-se o passo mais complexo. A coordenadora do controlo de qualidade segurava o meu macacão azul claro (para vestir por cima das duas peças azuis escuras que eu já tinha) por forma a que nem as pernas nem os braços do fato tocassem no chão. Assim, eu tinha de enfiar uma perna e depois a outra, sem que nenhuma parte do macacão tocasse no chão, caso contrário teria de se ir buscar outro (ou eu era exterminada, não sei). Juro que estava em stress. Tinha visto a colega da frente fazê-lo e parecia o Vincent Cassel a dançar com os lasers no Ocean's Twelve. Pensei que ia ter de desperdiçar uns 10 fatos até conseguir, imaginei que talvez me estatelasse ao comprido, mas com muita concentração e alguma ginástica lá consegui à primeira. Calcei uns sapatos de borracha desinfectados por cima das meias descartáveis que estavam por cima das minhas próprias meias. Depois, enfiei o capuz por cima da touca que já tinha. E meti uns óculos. E, como tenho unhas de gel, calcei umas luvas. E desinfectei as luvas. E finalmente abriu-se a porta que nos ia levar à parte da visita propriamente dita. Ah, de referir que este é o procedimento para quem queira andar APENAS nos corredores (observando as salas onde tudo acontece através de umas janelas enormes). Quem queira mesmo entrar nas salas de operação (e só entra quem lá trabalha) tem de passar a um outro nível de protecção. Acho que há, de resto, cinco escalões de protecção, consoante as diferentes áreas e suas especificidades.
Gostei muito de ver tudo. Perceber que todos os procedimentos são anotados, com aquilo que é feito, a data, a hora, o nome de quem fez. De resto, 70% do tempo de produção é dedicado ao controlo de qualidade. Eles não brincam (nem podem) com a segurança. Vi a sala em que as células começam por chegar, e depois a outra sala onde são postas a crescer: primeiro num recipiente de 150 litros, onde ficam 3 semanas, a seguir num recipiente de 600 litros, onde ficam mais uma semana. Toda aquela maquinaria complexa em inox, cheia de tubos e luzes, podia lamber-se, de tão limpa, como de resto o chão, as janelas, as paredes. Nós não podíamos tocar em nada. Nem o bracinho a raspar ao de leve numa parede. Só para perceberem o nível da coisa.