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Cocó na fralda

Cocó na Fralda

Peripécias, pilhérias e parvoíces de meia dúzia de alminhas (e um cão).

DNA, 20 anos depois

A explicação deste projecto está no próprio projecto (na página 3) mas torno a explicar aqui, para que percebam do que se trata.

Em 1997 fiz, no DNA (suplemento do Diário de Notícias), uma reportagem com 11 crianças com idades entre os 3 e os 10 anos. Em 2017 (no ano passado) essa reportagem completou 20 anos. O Pedro Rolo Duarte, que foi o mentor e director do DNA, estava gravemente doente mas, quando começou a haver uma esperança no seu restabelecimento, pensei em recuperar este trabalho. Ir à procura das 11 crianças, hoje adultas, e saber o que era feito delas. O objectivo era dar-lhe esse projecto de presente. Impresso, em mão. Não como despedida, mas como celebração da vida.
Infelizmente, a doença trocou-nos as voltas. O Pedro não lhe resistiu e o meu presente ficou sem sentido. Mas depois veio a ideia da homenagem. E então terminei-o. Estes são os mesmos 11 entrevistados, 20 anos depois. A Madalena foi a capa na primeira edição e agora. Este é o meu presente, a minha homenagem a alguém que mudou, para sempre, a minha vida. 

CLIQUEM NA IMAGEM PARA VEREM O PROJECTO NA ÍNTEGRA

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Sábado. Um dia difícil que acabou a ser menos difícil, com uma boa ajuda

24 de Novembro. Fez um ano que o Pedro nos deixou. Um ano. A namorada do Pedro organizou um almoço restrito de amigos na Praia Grande e foi mesmo bom e bonito. O mais curioso é que pessoas que não se conheciam, que não faziam parte dos mesmos círculos (o Pedro, como todos nós, tinha um grupo maior de amigos e depois tinha os outros, soltos, dispersos, que nunca ou raramente se cruzavam uns com os outros), conheceram-se (ou reencontraram-se) e... houve ali um clique, uma coisa qualquer (que não é uma coisa qualquer, é algo de bem definido, é o amor que nos unia a ele) que nos juntou, que nos fez ter uma cumplicidade boa, um prazer em estarmos em união, quase como se o sentíssemos mais perto, quase como se o sentíssemos por perto.

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A propósito de celebrar a vida, quem queira recordar pode ouvir dois belíssimos programas de rádio que homenagearam o Pedro (e onde é possível escutá-lo, o que sabe sempre tão bem).

Encontros Imediatos, de João Gobern e Margarida Pinto Correia (Antena 1)

A Ronda da Noite, de Luís Caetano (Antena 2)

 

Amanhã, se tudo correr bem, será a minha vez de aqui deixar um projecto que tenho em mãos há um ano. Um projecto que começou por ser um presente para ele mas, como a puta da doença dele me trocou as voltas e mo levou, acabou a ser uma homenagem. 

Estou viva, pessoas

Não tenho cá vindo por estar a terminar aquele projecto lindo que tenho em mãos há um ano. Para a semana, se tudo correr bem, vão poder vê-lo, saboreá-lo, e espero que apreciá-lo como eu. Tem sido muito emocionante, muito intenso, muito bonito. 

Galp, a Luz dos Portugueses, e a luz do Miguel

Já decorre desde Janeiro de 2018 a campanha "A Luz dos Portugueses", em que a Galp oferece um mês de electricidade grátis a todas as famílias dos bebés que nasçam no dia 1 de cada mês.  Basta ir AQUI e ver as condições e a forma de se inscreverem. O objectivo da campanha é o alerta para a queda da natalidade que, no nosso país, é verdadeiramente assustadora.

E desde Janeiro que o Cocó na Fralda não quis deixar de se juntar a esta iniciativa e, em colaboração com a Galp, lançou um passatempo (que se repete todos os meses até ao final do ano), em que um bebé nascido em cada mês (e sorteado via random) ganha uma sessão de Baby Art, com a talentosíssima Raquel Brinca

No mês de Outubro ganhou o pequeno Miguel.

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A culpa disto tudo foi do Facebook. Sem ele talvez os destinos da Sónia e do Diogo nunca se tivessem cruzado e o Miguel nunca tivesse chegado a pousar para a mágica lente da Raquel Brinca. Nunca saberemos mas, pelo sim pelo não, agradeçamos à rede de Zuckerberg por este encontro semeado que já está a dar bons frutos. 

Tudo começou quando Diogo, ao navegar, recebeu a indicação do facebook - visionário - de que a Sónia podia ser uma potencial amiga. Sugeriu-lhe amizade mas ela pensou em não aceitar. Depois, olhou de novo para aquele tipo com aparente bom ar, de olho claro, e pesquisou-lhe as amizades. Havia bastantes nomes que tinham em comum pelo que, em calhando, talvez não se tratasse de um pervertido qualquer.

Começaram então a falar e, umas duas semanas depois das primeiras conversas, ele convidou-a para um café. Ela disse que sim mas alertou a mãe: "Se eu não der notícias em meia hora faz alguma coisa!" (Ah, os filhos, sempre espantosos na arte de apaziguar os corações dos pais!) Quando ele chegou - porque fez questão de a ir buscar a casa, que é de um cavalheiro de que estamos a falar - as duas, mãe e filha, puseram-se à espreita na janela. "É bem parecido", disse a mãe. Não parecia haver perigo, desejaram as duas. E lá o encontro aconteceu. Era Outubro de 2012.

O café correu bem, seguiu-se-lhe outro e um jantar e um fim-de-semana. Ela encantou-se pela energia dele, pela proactividade, e pelo facto de gostar de cozinhar: "Como eu não gosto sempre disse que tinha de arranjar alguém que gostasse. Nem queria acreditar quando encontrei!". Ele não sabe bem elencar o que gostou nela: "Foi tanta coisa! A beleza, a capacidade de comunicação, a maneira de ser. É muito decidida, é uma mulher que sabe bem o que quer e o que não quer." Bom, foi tal o encantamento mútuo que, em Janeiro de 2013 (três meses depois), estavam a arrendar uma casa e a viver juntos. 

Sónia é formada em Psicologia Clínica mas acabou a trabalhar em consultoria informática. Ele é engenheiro na Marinha Portuguesa. Os primeiros tempos a viverem juntos não foram fáceis, houve que acertar agulhas, claro. Mas era mais o que os unia do que o que os separava. "Acho que sempe fomos complementares. Ele é muito enérgico, eu sou mais tranquila. Às vezes ele puxa por mim, outras vezes eu acalmo-o."

Em Março foram buscar o primeiro cão, o Sushi, e em Dezembro de 2016 chegou lá a casa a Maki. "Para nós os nossos cães são família. Acho que foram eles que também nos foram fazendo uma família e, de certo modo, preparando para sermos pais. Quando conheci o Diogo, ele queria muito ser pai. E era cedo. Ainda tínhamos de viver muita coisa antes de avançarmos para uma decisão tão importante. De maneira que os cães foram assim o primeiro degrau."
Pelo meio casaram, em Maio de 2015. Casar era um dos objectivos comuns e fizeram uma cerimónia simples, apenas com 55 convidados: "Preferimos apostar na lua-de-mel do que gastar tudo numa festa de arromba." Estiveram 11 dias na Tailândia e foi inesquecível. De resto, ambos adoram viajar e há, pelo menos, duas viagens de sonho comuns a ambos: Japão e Peru (especificamente Machu Picchu).

O Miguel foi um filho planeado. Começaram a tentar engravidar em Dezembro e Sónia descobriu que estava grávida em Fevereiro. Foi o chamado "tiro e queda". A gravidez correu muito bem, Sónia adorou o estado de graça. 

No dia 29 de Outubro pelas 14h começaram as contracções. Às 19h ficaram mais dolorosas mas Sónia só foi para o hospital à meia-noite. "Quando lá chegámos disseram que sim senhora, tinha muitas contracções, mas ainda não estava em trabalho de parto. Voltei para casa e às 4.30 da manhã regressei porque já não aguentava mais. Fiquei todo o dia 30 em trabalho de parto e o Miguel só nasceu às 19.55, de cesariana. Estava mal posicionado, a médica ainda tentou fazer uma manobra para o pôr direito mas acabaram por optar pela cesariana. Não estava à espera e foi um momento stressante, mas pronto. Paciência."

Diogo assistiu, não resistiu às lágrimas quando viu o filho nascer, e Sónia, apesar de meia atordoada com tanta epidural, diz que ter o Miguel nos braços, acabado de chegar ao mundo, foi das experiências mais incríveis de sempre. 

Se dentro da barriga, o Miguel fazia lembrar o pai (sempre ligado à corrente), cá fora a coisa é bem diferente. "É um paz de alma. Come, dorme e não chateia ninguém. E, sim, estamos muito encantados com ele." Como não? O Miguel é um amor. E a culpa é do Facebook. :)

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Já estão abertas as inscrições para os bebés nascidos em NOVEMBRO!

Quem quer fazer uma sessão com a Raquel, quem é?

Já sabem como funciona: enviam um email para sonia.morais.santos@gmail.com com a data de nascimento do vosso rebento, e também o número de telemóvel (pais que acabaram de ter bebés podem não ligar muito ao email e depois para entrar em contacto é um sarilho). Em seguida, o vencedor é escolhido via random.

Uma vez mais obrigada, Galp, por esta oferta aos pais! E à Raquel Brinca... aquele beijo apertado pelo profissionalismo e carinho de sempre.

Aniversário duplo

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Não imaginam o prazer que me dá fazer o jantar nestas datas especiais, o arroz doce, os brigadeiros. Podia comprar mas... não era a mesma coisa. As únicas coisas que não fiz foram os bolos de aniversário. Um foi oferecido pela Carolina, da Sweet in a Box, que me enviou um email a dizer que gostava de oferecer uma Pavlova (e ganhou uma cliente!), o outro foi a namorada do Manel que fez (e era um sonho de chocolate).

Éramos 18 à mesa, ou seja, foi uma espécie de ensaio para o Natal (que este ano é cá em casa).

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Depois do jantar e dos parabéns, pusemos o Mateus a atacar uma pinhata da YummyTummy Pinhatas. Foi o seu primeiro ataque e teve de lhe fazer várias investidas até choverem doces. 

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E pronto. 

Estão despachados os 3 escorpiões da casa.

Venha o Natal!

Conta-me #11

E então ele vociferou:

- Pois eu estou-me positivamente cagando para esta família. 

E saiu.

Não foi só a palavra que nos deixou estarrecidos, os garfos no ar, a caminho das bocas, congelados no tempo como se o tempo tivesse, por obra daquela frase, realizado a proeza de congelar. Não foi apenas a palavra, jamais proferida por aquela boca, de onde nunca saíra uma incorrecção. Foi o tom definitivo, o advérbio contundente atrás do verbo cagar, o modo teatral com que abandonou a sala em seguida, a repulsa com que ainda mirou as loiças Companhia das Índias dispostas na cristaleira que havia sido da bisavó.

De então para cá, o pai nunca mais foi o mesmo. Sempre foi um senhor. Quando me ia buscar ao colégio, recostado no banco de trás do carro conduzido pelo fiel Augusto, os meus colegas e os professores paravam para nos ver passar. Não, não eram coisas da minha cabeça. Era de facto assim, quase como se também então o tempo petrificasse com a sua presença (apesar de ser por outros motivos que não os de agora). O pai usava sempre um chapéu e um sobretudo. Será tolice minha e isso sim, produto da minha fantasia, mas seria capaz de garantir que até no verão se apresentava de sobretudo. Sim, claro que é tolice. Seria uma atitude despropositada e o pai nunca era, nunca foi, descabido em qualquer tipo de conduta, fosse à mesa, fosse no modo de vestir, de caminhar, de cumprimentar. O pai era um senhor. E a sua rectidão dava-me um conforto que se assemelhava a uma sombra, a um aconchego, um ninho. Não falava muito, o pai. Mas sentir aquela mão na minha mão bastava-me. Sentia-me o rapaz mais afortunado do mundo. Ninguém em parte alguma podia ser mais feliz do que eu quando ia assim, de mão dada com o pai.

Ninguém nunca soube o que provocou a mudança. A mãe irritava-o, claro, com as suas manias da limpeza e da ordem. Mas isso era compreensível. Na verdade, a mãe conseguia dar conta dos nervos de todos, empregadas incluídas, que nunca limpavam suficientemente bem, que nunca sabiam o sítio milimetricamente correcto das coisas, que nunca mereciam - na sua opinião - o dinheiro que lhes pagávamos. Talvez tantos anos de convivência com a personalidade histriónica daquela mulher desequilibrada pode levar o juízo a qualquer um. Os filhos seguiram com as suas vidas, saíram daquela casa, mas ele ficou. Refém. Agora que penso no assunto, recordo que uns dias antes da frase que mudou a nossa vida, a mãe tinha-me ligado num pranto:

- O seu pai... - começou, soluçando. - O seu pai pegou em tudo o que estava nas prateleiras e atirou ao chão. Está louco. Saiu daqui a dizer que ia escolher o bordel mais imundo da cidade e que só voltava quando se sentisse suficientemente sujo e... e... e vivo.

Compreendi a urgência da situação. Larguei tudo e fui até lá. Com efeito, tive dificuldade em reconhecer a sala de estar da casa em que cresci. Onde antes havia ordem (mais que ordem, praticamente um cenário), agora reinava o caos. Nem um único livro ou moldura no lugar. Havia cacos por toda a parte e a mãe aparentava uma tonalidade entre o branco e o roxo, talvez uma matiz que nunca antes tinha vislumbrado.

- Já viu, António? Já viu isto? O seu pai... o seu pai.

Horas mais tarde - já as minhas irmãs estavam em casa, tentando consolar a mãe - chegou ele. Desgrenhado, com marcas de baton nos colarinhos (palavra de honra, parece uma hiperbolização, um daqueles clichés exacerbados e cinematográficos que usamos quando queremos que as pessoas entendam exactamente aquilo de que estamos a falar, mas não, o pai tinha mesmo marcas de baton encarnado nos colarinhos, tal como vemos nos filmes) e um cheiro a perfume reles (juro). Olhou para mim, riu alarvemente e declarou:

- António, há um sítio que tem de conhecer. Se quer sentir-se vivo. Agora, se me dão licença, vou dormir. Dói-me num sítio que não posso revelar. - e saiu com uma gargalhada gutural.

Dois dias depois, mais calmo, consegui que conversássemos um pouco no escritório. Achei que era assunto para dois homens adultos, ainda que fôssemos pai e filho:

- Pai, quer explicar-me o que aconteceu aqui há um par de dias?

- António, a sua mãe desespera-me. Enlouquece-me. Por falar nisso, devia divorciar-se da Teresa, essa puta neurótica que claramente lhe inferniza a vida e que é a cópia perfeita da sua mãe. Eu não o posso fazer. Que seria. Agora, com esta idade, a pedir o divórcio, a sua mãe ainda fazia alguma cena, era capaz de ser pior a emenda que o soneto. Mas a verdade, filho [ele nunca me tinha tratado por "filho"], é que não suporto mais vê-la levantar-se 15 vezes por noite, enquanto tento ler um livro, para ajeitar o saleiro ou o castiçal mais para a esquerda ou mais para a direita. Falamos de milímetros, António. Creio até que ela os move um pouco para depois tornar a movê-los e acabar a deixá-los exactamente na mesma posição em que estavam no início. É patético, filho [a segunda vez, em segundos]. É patético e triste e eu estou exaurido desta vida patética e triste que levamos.

E depois desta explicação, proferida com calma e lógica (o que me fez recuperar a esperança de que talvez tudo se remediasse), o pai regressou à loucura. No dia seguinte acordou, despiu-se para tomar banho mas, em vez de seguir para o duche, dirigiu-se para a cozinha. As empregadas não queriam acreditar. O senhor engenheiro estava em pelota junto ao lava-loiça. E, como se não bastasse, ainda se roçou pela mais nova, revelando de imediato uma espantosa erecção.

- Qualquer dia ensino-te umas coisas.

A rapariga ruboresceu e foi incapaz de balbuciar uma palavra. A imagem daquele membro hirto encostado a si aterrorizava-a. A Arminda, que está connosco desde sempre, segurou o peito porque cuidou que o coração lhe fosse perfurar a caixa torácica e a pele e talvez pudesse ainda ampará-lo com as mãos. Ninguém foi capaz de contar nada à mãe. Fui eu quem ouviu, aturdido, o relato das duas mulheres. E tem sido esta a minha vida. Ouvir queixas sobre o pai. O senhor engenheiro. O distinto senhor de sobretudo.

Entre as várias que nos tem feito nos últimos meses - sim, que não tarda e vai fazer um ano com que nos brindou com aquela frase com que decidiu alterar a nossa existência - entre as várias pérolas, dizia, destaca-se a ideia peregrina de urinar para uma garrafa de plástico de litro e meio, com que anda todo o dia debaixo do braço. 

- Temos de poupar, António. Temos de começar pelo básico, pela água. Se puxamos o autoclismo de cada vez que mijamos [outro vocábulo impossível no léxico do pai que conheci], e eu mijo muito, António, a conta vai por aí fora. Assim, devemos todos andar com uma garrafa e só despejamos quando estiver cheia. Hã? O que lhe parece? De génio!

Isso e o dia em que me cruzei com uma puta no corredor são os episódios que me ocorrem assim de repente, agora que falamos nisso. Sim, uma puta. A mãe transida na salinha da leitura, a tremer, e a puta a sair do quarto deles, ainda a ajeitar a roupa, e atirando um beijinho provocador.

- Isto é demais para mim, António! O seu pai foi longe demais! Ele ou eu, alguém vai ter de sair desta casa!

Logo de seguida, o pai apareceu na salinha, e sou capaz de jurar que apareceu de braguilha aberta com o propósito único de a chocar.

- Então, filha? - perguntou com um suspiro quando desabou na poltrona - O que é o almoço? Estou cá com um apetite! De touro!

E por isso, doutor, não sei. Não sei que lhe diga. A mãe emagrece a olhos vistos, está tão magra que tenho para mim que qualquer dia desaparece entre uma puta e uma garrafa de litro e meio de mijo. As minhas irmãs deixaram de frequentar a casa, desde que o pai as recebeu de tanga de tigre [não me pergunte onde arranjou aquilo] e as quis convencer a urinarem para dentro de garrafas de plástico. A empregada mais nova fugiu e nunca mais ninguém soube dela desde que o pai lhe apareceu todo nu na cama, dizendo ter chegado o dia em que o professor ia ensinar umas coisas à aprendiz. E até a vizinhança cortou relações com a família desde que se descobriu que era o pai quem andava a pintar frases nos carros: "Forniquem já antes que a vida vos fornique". Como imagina, não escreveu "fornique", eu é que não me atrevo a ir tão longe. Mas o doutor percebe. De modo que não sei. Sinto-me perdido. E o pior é que às vezes acho-lhe graça. Às vezes acho que o compreendo, sabe? Toda a vida foi o senhor engenheiro, o homem imponente de sobretudo. Creio que se terá fartado. Cansou-se. Deixou cair a máscara. Abriu o sobretudo, se é que me faço entender. E eu há alturas em que eu - salvo as devidas distâncias que separam um doido de um homem são - tenho vontade de fazer o mesmo.

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(eu sei que isto não é um sobretudo, mas uma gabardina, ok? Mas foi o melhor que encontrei 😂)

 

*Conta-me é uma rubrica do blogue Cocó na Fralda com contos escritos pela autora

Um aniversário... diferente

O Mateus passou o aniversário doente. Chovia a cântaros lá fora. O Manel faz anos amanhã. Tudo razões mais que suficientes para nos encostarmos bem encostadinhos uns aos outros e passarmos o dia enfiados em casa, sem mais festejos que mimos a rodos ao benjamim, e presentes, e um bolo completamente banal (leia-se rectangular, de chocolate, e com um desenho da Patrulha Pata por cima - parecia um bolo de quando eu era pequena - mas excelente, por acaso), encomendado nessa manhã quando, de um salto, nos lembrámos que nem bolo tínhamos, e recolhido às 17h para soprar as velas a seguir ao jantar. Não houve convidados, nem a família mais alargada nem amiguinhos, não houve balões, bandeirolas, enfeites, bolos a três dimensões. Fez-nos um bocadinho de impressão mas... a ele não. Estar sossegado em casa é das suas actividades preferidas (é igualzinho ao irmão mais velho, benza-os Deus, escorpiõezinhos mais caseiros e complexos) e a verdade é que os miúdos tão pequenos não precisam de tudo isso. Lembro-me das festas de aniversário do Manel. Ah ah ah. Que luxo! Tudo cheio de detalhes, grinaldas de não sei quê, posteres na porta, balões na rua... toda uma parafernália de acessórios festivos desde o 1º aniversário em que ele está em todas as fotos com cara de "Whaaaat?"

No dia seguinte fomos a casa de uns amigos e houve mais um bocadinho de ambiente de celebração, porque a minha amiga tinha feito anos há escassos dias e, assim, sopraram ambos as velas.

De todo o modo, amanhã juntaremos as duas festas, a do Manel e a do Mateus (caramba, estar a convidar a família a 10 e a 13 para rambóias cá em casa... nem com muito boa vontade!). Seremos 18, se não me falham as contas, e já tenho o olho direito a tremer só de pensar em toda a logística. Depois, no próximo fim-de-semana, o Manel vai festejar o aniversário com alguns amigos. Onde? Numa casa, pois claro. Sossegado. 

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Rota da Saúde #7: Como lidar com o mau humor dos adolescentes?

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Sou uma afortunada (por enquanto, que cheira-me que quando chegar a vez da Madalena vai ser um vê se te avias). O Manel tem por vezes mau feitio e algum mau humor mas é raro (e, em bom rigor, quem não tem?). Regra geral é um miúdo incrível, que ajuda imenso, que resolve problemas como se fosse pai, que ralha connosco quando acha que estamos a deseducar o Mateus (e às vezes estamos mas a paciência já não é a mesma e praticamos muitas vezes o "deixa andar" para desespero do mais velho), que sai à noite de vez em quando mas sem exageros, que é super tranquilo, que estuda sem ser preciso mandar, que gosta de estar em casa, que não se isola no quarto sem pachorra para nós. O Martim, que vai fazer 14 anos, é o maior porreiro e nunca está de mau humor. É o que eu digo: é aguardar pela adolescência da Mada, que aí é que - acho - vão ser elas!

Bom, mas tudo isto para dizer que a adolescência pode ser uma fase conturbada. Podem existir guerras de palavras, conflitos com os pais, discussões a toda a hora que ameaçam dar cabo da harmonia familiar. O pediatra Sérgio Neves, da Clínica de Stº António e da Clínica Lusíadas Almada, diz que é importante ter noção de que a adolescência implica mudanças físicas significativas: "As hormonas sexuais influenciam o desenvolvimento do cérebro, modificando o comportamento do adolescente, nomeadamente ao nível do humor e da impulsividade, bem como os seus interesses e capacidades intelectuais".

A verdade é que, para os próprios jovens, também pode ser angustiante lidar com as mudanças de idade e, por isso, o ideal é que os pais tenham alguma empatia para com todas estas alterações de que eles estão a ser alvo.

 

Autoridade versus permissividade

Educar torna-se, nesta fase, quase sempre um quebra-cabeças para muitos pais. Muitas vezes, o que antes tinha um efeito positivo, de repente parece ter deixado de resiltar e vice-versa. "Será que sou demasiado autoritário? Ou, por outro lado, muito permissivo? Para o especialista, no entanto, a resposta é óbvia: nenhum dos métodos resulta. O melhor é mesmo optar por um meio-termo, recorrendo ao sempre tão elogiado bom senso e praticando aquilo a que se chama um "método autoritativo". Ou seja, uma educação baseada em:

- Regras bem definidas (de preferência discutidas previamente com o adolescente);

- Sanções conhecidas ao não cumprimento e com uma duração definida;

- Adaptação das regras e limites à maturidade do adolescente (flexibilidade, equidade e justiça);

Sérgio Neves lembra ainda que:

- As sanções não devem envolver actividades promotoras de saúde, como o desporto;

- Há que promover a autorregulação do adolescente (para melhor lidar com a frustração)

- Poderá ser benéfico chamar à negociação pessoas que sejam significativas para o adolesccente (por exemplo, outro familiar, um treinador, um professor);

- O diálogo deve ser tido depois do "episódio de conflito";

É importante promover e valorizar as qualidades e ganhos dos filhos.

 

"Onde é que eu errei?"

A experiência de Sérgio Neves permitiu-lhe, ao longo dos anos, identificar quais as situações que os pais devem evitar, de modo a facilitar a relação com os filhos adolescentes. Os erros mais comuns são:

- Exaltarem-se e perderem a calma;

- Os pais sentirem que já não são exemplo ou importantes na vida dos seus filhos;

- Os filhos serem vistos como um foco permanente de conflito;

- Não serem capazes de reforçar os ganhos e aspectos positivos dos filhos;

- Sentirem que estão sozinhos na educação dos seus filhos;

- Fazerem comparações entre os filhos e os seus amigos e/ou colegas;

- Projectarem nos filhos as suas próprias vivências como adolescentes;

- Não aceitarem a diferença (crenças, orientação sexual, opção religiosa...)

Por vezes há sinais de alerta a que os pais devem mesmo estar atentos. Leiam mais AQUI.

 

(esta rubrica é uma parceria com a Lusíadas Saúde)

 

Parabéns, Mati!

Tens 4 anos mas nós amamos-te há 6. Estivemos dois anos à tua espera e sentíamos a tua falta na família como se fosses um membro do corpo que ainda não nos tivesse crescido e, por isso, nos fizesse sentir uma incompletude inexplicável. Sim, inexplicável. Quando se tem três filhos ninguém percebe muito bem esse profundo desejo de ter mais um, tão profundo que chegámos a ir a uma clínica de fertilidade saber quais seriam as nossas opções para que viesses para a nossa família (depois calhou que nem chegasse a ser preciso fazer nada, que decidiste poupar-nos umas coroas valentes).

Durante dois anos sentíamos que nos faltava um de nós mas tínhamos que o sentir em silêncio porque é ofensivo para quem está a esforçar-se tanto para ter o primeiro e é absurdo para todos os outros. Mas sentíamos. Era como se já fizesses parte de nós, mesmo antes de fazeres. 

Hoje fazes 4 anos. E só podemos dizer, todos e cada um: ainda bem que vieste. Fazes tanto sentido aqui. É tão bom ter-te. Obrigada, querido mais querido Mati. Parabéns.

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 Foto: Inês CM, Afterclick

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