Os filhos, quando nascem e quando são pequenos, amam os pais acima de tudo e, nessa altura, a balança de amor está equilibrada. É o auge da felicidade. Os pais sentem o amor explodir-lhes no peito e, na volta do olhar, sentem que são correspondidos na mesmíssima medida. Há beijos, abraços, palavras que se dizem sem pudor ou embaraço ou medo de uma reacção torta. É só amor puro, desmedido, desnorteado, sem filtro, sem rede, sem limite. Depois os anos passam e a balança do amor começa, lentamente, a pender mais para o lado dos pais. É um movimento discreto primeiro, ténue, ligeiro, quase imperceptível. Na volta do olhar já não se vislumbra a mesma adoração, a mesma ternura, a mesma reciprocidade de amor. O abraço já não tem a mesma entrega, os beijos já não são oferecidos com o mesmo fragor, há algum pudor nas palavras. Custa mas, como é gradual, vai-se desvalorizando. Assobiando para o ar, fingindo que não está a acontecer. Até que há um dia em que uma mãe (ou um pai, mas nestas coisas acho que uma mãe percebe primeiro), dizia, há um dia em que uma mãe sente que a balança se desequilibrou definitivamente. Um movimento brusco, súbito, violento, que faz compreender que o dia chegou. O dia em que o amor dos pais é ainda (e sempre) incondicional mas o amor dos filhos é já outra coisa. Esse dia dói porque é para sempre - a balança nunca mais se equilibra. É um movimento sem retorno. Dói mas é preciso perceber que as coisas são como são e não há nada que se possa fazer para mudar o modo como Deus ou a natureza ou o destino ditou o funcionamento disto tudo. É preciso perceber e simplesmente aprender a viver com isso.