Recomeço
Hoje foi o primeiro dia de aulas para o Martim. Já está no quarto ano e ainda ontem era um bebé de bibe. Ia com vontade porque as férias foram cheias e porque, na última semana e meia teve tempo para se aborrecer, aqui por casa. No outro dia lia um texto de alguém (infelizmente não me lembro quem foi o autor) sobre a falta que faz as crianças aborrecerem-se. Terem tempos mortos, sem fazerem mais que olhar para o tecto e pensarem na vida. É tão verdade. Hoje parece que temos de os encher de actividades, de coisas para fazer, jogos, brincadeiras, inteligentíssimas, de preferência. Como se não tivéssemos tido, em crianças, horas de seca sem sabermos o que fazer. Eu cá tive. Lembro-me de estar em casa dos meus avós, a olhar para o relógio quando virava o minuto, fechar os olhos, contar até 60, e depois abrir de novo os olhos para ver se tinha acertado na passagem certinha do minuto. Ou ir para a janela contar os carros encarnados, brancos, azuis e pretos, para fazer uma espécie de estatística. Lembro-me de não ter nada para fazer e inventar coisas. Hoje, os miúdos parecem ter perdido essa habilidade. De inventarem soluções para o seu próprio aborrecimento. Ou deixarem-se, simplesmente, aborrecer. O Martim não foge à regra e, por isso, esta semana e meia em que quase nada fez bastou-lhe para sentir vontade de regressar à escola. O reencontro com os amigos e com a professora Helena, os vários abraços e sorrisos foram bons de ver. Pena a chuva. Raio de verão este. Bom ano, Martim. Bom ano para todos os que agora recomeçam (aqui por casa ainda faltam dois).