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Cocó na fralda

Cocó na Fralda

Peripécias, pilhérias e parvoíces de meia dúzia de alminhas (e um cão).

Mais palavras novas


Través. Orsar. Arribar. Palhetada. Patilhão. Finger. Odómetro. Lançante de proa. Lançante de popa. Cabeço. Cunho. Rejeira de proa. Rejeira de popa. Spring. Fundear. Encapelar. À garra. Amarra. Quartelada. Escovém.
Às terças e quintas, das 21.00 às 23.30, palavras e expressões novas entram como vagas no meu cérebro. A avaliar pelas primeiras aulas, vou passar o próximo mês e meio a sonhar com barcos e naufrágios, duas noites por semana.

Ser rinoceronte e gostar


Hoje foi o dia de ler uma história lá no colégio. O Manel estava histérico, a mãozinha suada na minha, os saltinhos nervosos, um sorriso rasgado. Chegámos a horas, o que deu origem, até, a uma piadola da professora, pouco acostumada a tão rigorosa pontualidade.
Lemos O Rinoceronte Muito Malcriado, de Jeanne Willis e Tony Ross. Eu fiz de narrador e de várias personagens, o Ricardo fez de... rinoceronte. Muito bem, aliás. Os miúdos riram à gargalhada, a professora também. Acho que subimos bastante na consideração do Manel que, no final da história, veio a correr e deu-nos um grande abraço. Não me importava de começar todos os dias assim.

O teu azimute e a minha quilha


Ontem foi tudo (ainda mais) a correr. Brincámos, vestimos-lhes o pijama, demos-lhes o jantar, pusemos o Noddy e saímos em passo apressado. Era a nossa primeira aula do curso de Patrão Local no Centro Náutico da Expo. Fomos a pé, quase a correr, e chegámos a horas (21.00).
O comandante Martins da Cruz apresentou-se e explicou que vamos sair dali a saber navegar. Depois começou a perguntar aos alunos o que seria preciso ter antes de largar com a embarcação. E foi aí que percebemos que não basta saber mexer nos botões do barco e já está. Diz que vamos ter de saber ler cartas de navegação, vamos ter de nos informar sobre as condições meteorológicas, vamos ter de saber as marés, vamos precisar de comprar o Roteiro da Costa de Portugal para saber como entrar nos portos (saber quais os faróis que têm de estar em enfiamento e outras coisas do género), vamos ter de ter um sextante para medir a distância das estrelas e uma agulha para calcular o azimute. Falámos em pontos conspícuos, em graus, em bombordo e estibordo, anteparas e nós, amuras e alhetas, quilha, patilhão, calado, proa e popa.
Saí com a ligeira impressão de que nunca vou sair de um porto com um barco. Não porque não vá aprender, que não sou burra e aprendo depressa, mas porque uma viagem deve ser uma estafadeira de preparativos, planos e estudos. Mas pode ser só impressão... Para já gostámos de aprender coisas novas. E fomos todo o caminho para casa a fazer piadolas sexuais com o azimute e com a quilha, o que, parecendo que não, pode ser um exercício bem divertido (e útil, que todos os trocadilhos sobre sexo são proveitosos em casa onde há crianças).

Cruzes canhoto


Estava à espera dos rapazes, perto do Centro Comercial Vasco da Gama. Eles tinham ido buscar o almoço, eu guardavas bicicletas. Nisto, aproxima-se uma cigana. Eu, que gosto do diálogo intercultural e adoro velhotas e as suas histórias, disse-lhe boa tarde assim que ela se abeirou e até achei graça quando a vi sentar-se junto a mim, começando a frase com: "Ai menina, sabe..."
Pensei: ora aí está, vamos lá escutar uma boa converseta.
"Sabe... Tenho uma filha muito doente no hospital e preciso de a ir visitar. Não me arranja 50 cêntimos para eu apanhar um transporte para a ir ver?"
Foi a primeira desilusão. "Claro, tinha de ser dinheiro... Que ingénua que eu sou." E lá lhe expliquei que não tinha um tostão (verdade-verdadinha), que estava só à espera do meu marido e dos meus filhos, e até lhe mostrei os bolsos, puxando os forros para fora, exibindo a minha pobreza temporária. Nisto, a doce e velha senhora transformou-se na bruxa da casinha de chocolate, da história Hansel e Gretel. "Então está aqui a fazer o quê? Veio para aqui ver os homens, foi?" Para má educação, má educação e meia: "Sim, foi isso mesmo. Vim aqui só para ver homens. Nem mais."
Ela levantou-se a praguejar e eu fiz aquilo que faço sempre: cruzei os dedos. Não sei quem me ensinou isto, é capaz de ter sido a minha querida avó, mas faço-o sempre que não dou uma esmola. Como acho sempre que me vão rogar pragas, faço sempre figas. Eu nem sou pessoa de acreditar em fantasmagorias. Mas é instintivo, imediato e não consigo deixar de o fazer.
Às tantas olhei para o lado, e a cigana estava novamente aos gritos. A senhora ao lado também lhe gritava: "Mas o que é que quer que lhe faça? O meu marido levou a carteira!" A velha afastou-se a praguejar. Olhei de soslaio para a incrédula senhora. E ri-me. Ela estava com os dedos cruzados.

Campainhas e alarmes e o raio que os parta




Digamos que o dia não começou bem. Eram 8 da matina quando tocaram à porta. Aquele "triiiiiii" prolongado aqueceu-me o sangue nas veias. Dormíamos profundamente, o que, aos fins-de-semana e feriados, nem sempre acontece (Os miúdos têm esta coisa de acordar às 7 em dias de descanso e, se pudessem, só se levantavam às 11 em dia de escola). De modo que ouvi aquilo e nem me mexi, a ver se ninguém despertava. Só que, passado 1 minuto, já eu estava a ferrar no sono outra vez, "triiiiiiii". Passou-me uma coisa pelos olhos. Levantei-me à bruta, disse cerca de vários palavrões, e caminhei batendo com os pés com tanta força que parecia uma manada furiosa de efefantes. Rodei a chave na fechadura as vezes necessárias para abrir a porta com estrépito, impusionei o corpo para a frente e vi a porta da frente aberta. Percebi imediatamente. Eram os homens das obras que, desprezando quem descansa, decidiram tocar à maluca para várias campainhas. Ainda assim, fiz-me de parva e comecei: "Quem é? Quem é? Quem é?"
E eis que, vindo da porta da frente, surgiu um homem, visivelmente assustado pelo ar de louca que eu certamente apresentava (o cabelo desgrenhado, os olhos a chisparem ódio, as sobrancelhas frisadas de raiva): "Não é ninguém, foi engano".
Engano? Engano? Eu estou a dormir, porra. O meu homem está a dormir! Os miúdos, veja bem, até os miúdos dormem. E pumba. Mandei com a porta e fiz todo o caminho inverso, dois corredores percorridos em passo bélico, um salto para a cama e mais uma chusma de impropérios.
Eram 9.30 da manhã. Dormíamos ainda (meu deus, meu deus! muito e muito obrigada). E é então que começa a tocar o alarme do prédio: tinóni-tinóni-TINÓNI-TINÓNI-T-I-N-Ó-N-I-T-I-N-Ó-N-I! Pensei que ia ter uma síncope. Os putos acordaram aflitos. Não, não era um incêndio. Eram os homens das obras, gente sem amor pela vida (agora percebo a quantidade de acidentes de trabalho na construção civil) e a abusarem da sorte. E assim começou o meu feriado.

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