Estava à espera dos rapazes, perto do Centro Comercial Vasco da Gama. Eles tinham ido buscar o almoço, eu guardavas bicicletas. Nisto, aproxima-se uma cigana. Eu, que gosto do diálogo intercultural e adoro velhotas e as suas histórias, disse-lhe boa tarde assim que ela se abeirou e até achei graça quando a vi sentar-se junto a mim, começando a frase com: "Ai menina, sabe..."
Pensei: ora aí está, vamos lá escutar uma boa converseta.
"Sabe... Tenho uma filha muito doente no hospital e preciso de a ir visitar. Não me arranja 50 cêntimos para eu apanhar um transporte para a ir ver?"
Foi a primeira desilusão. "Claro, tinha de ser dinheiro... Que ingénua que eu sou." E lá lhe expliquei que não tinha um tostão (verdade-verdadinha), que estava só à espera do meu marido e dos meus filhos, e até lhe mostrei os bolsos, puxando os forros para fora, exibindo a minha pobreza temporária. Nisto, a doce e velha senhora transformou-se na bruxa da casinha de chocolate, da história Hansel e Gretel. "Então está aqui a fazer o quê? Veio para aqui ver os homens, foi?" Para má educação, má educação e meia: "Sim, foi isso mesmo. Vim aqui só para ver homens. Nem mais."
Ela levantou-se a praguejar e eu fiz aquilo que faço sempre: cruzei os dedos. Não sei quem me ensinou isto, é capaz de ter sido a minha querida avó, mas faço-o sempre que não dou uma esmola. Como acho sempre que me vão rogar pragas, faço sempre figas. Eu nem sou pessoa de acreditar em fantasmagorias. Mas é instintivo, imediato e não consigo deixar de o fazer.
Às tantas olhei para o lado, e a cigana estava novamente aos gritos. A senhora ao lado também lhe gritava: "Mas o que é que quer que lhe faça? O meu marido levou a carteira!" A velha afastou-se a praguejar. Olhei de soslaio para a incrédula senhora. E ri-me. Ela estava com os dedos cruzados.