Oferece-se Poesia
Estava sair do supermercado quando uma menina do Colégio João XXIII me entregou um papelinho. "Estamos a distribuir poemas, no âmbito do Dia Mundial da Poesia". Olha que bonito. O dia foi na semana passada (21 Março) mas a poesia oferecida assim à saída de algo tão prosaico (e pouco poético, pelo menos à primeira vista) como um supermercado, soube mesmo bem.
A mim calhou-me este poema, de Nuno Júdice (A Matéria do Poema)
O poeta quer escrever sobre um pássaro:
e o pássaro foge-lhe do verso.
O poeta quer escrever sobre a maçã:
e a maçã cai-lhe do ramo onde a pousou.
O poeta quer escrever sobre uma flor:
e a flor murcha no jarro da estrofe.
Então, o poeta faz uma gaiola de palavras
para o pássaro não fugir.
Então, o poeta chama pela serpente
para que ela convença Eva a morder a maçã.
Então, o poeta põe água na estrofe
para que a flor não murche.
Mas um pássaro não canta
quando o fecham na gaiola.
A serpente não sai da terra
porque Eva tem medo de serpentes.
E a água que devia manter viva
a flor escorre por entre os versos.
E quando o poeta pousou a caneta,
o pássaro começou a voar,
Eva correu por entre as macieiras
e todas as flores nasceram da terra.
O poeta voltou a pegar na caneta,
escreveu o que tinha visto,
e o poema ficou feito.
Obrigada pela poesia, à saída do supermercado.