Malabarismo
Sempre que apanho malabaristas em semáforos, saco da carteira. Talvez tenha sido artista de circo numa outra vida, talvez me dê gozo encontrar uma forma de arte quando menos a espero (entre emissões de monóxido de carbono, aguardando que o vermelho passe a verde), ou talvez me agrade simplesmente ver quem faz pela vida, em vez de simplesmente estender a mão para a esmola. Estes novos "pedintes" (e são-no, efectivamente, porque nos pedem) têm um saber que eu não possuo e, só por isso, merecem a minha atenção. Atiram quatro ou cinco coisas ao ar e deslumbram-me com a sua perícia. Naqueles breves segundos, mostram a sua habilidade, sorriem, tiram o chapéu e curvam-se para agradecer aos espectadores ocasionais. Hoje, estava com a minha mota num desses semáforos povoados por artistas circenses e, no final da actuação, bati palmas. O rapaz sobressaltou-se. Voltou a cabeça na minha direcção, quase assustado. Não esperava a ovação, o que me entristeceu. Um artista em cena, que não conta com o aplauso, só pode ser um artista infeliz. Sorriu-me. Sorri-lhe de volta. Estendi-lhe o parco pagamento pela curta performance. Depois, o sinal mudou e eu avancei. Ele continuou por lá, a existir entre o vermelho e o verde, sem esperar aplausos.