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Cocó na fralda

Cocó na Fralda

Peripécias, pilhérias e parvoíces de meia dúzia de alminhas (e um cão).

Dias e dias

Há dias em que acordas e tudo flui. O teu filho mais pequeno abre os olhos e lança-te o maior dos sorrisos. Uff. Talvez corra tudo bem. A outra filha espreguiça-se e também sorri. Vai correr bem. Não se arrastam, não protestam contra o pequeno-almoço, vestem-se depressa. Sais a tempo para ir a cantar pela rua, a dançar, a conversar sobre a vida. Quando os deixas na escola, com um beijo, sentes um calor invadir-te o coração. Sorris. És uma boa mãe. Trataste de tudo sem esquecer os detalhes mas também soubeste ser carinhosa, divertida, feliz. Ainda que o resto do dia não seja perfeito, a manhã já ninguém te tira. E, se ao final do dia, também tudo fluir (mais difícil porque entram mais dois na equação), então deitas-te com a sensação de que, se calhar, foste mesmo talhada para isto de ter uma família, porque no meio da loucura da tua vida ainda conseguiste fazer um bom pequeno-almoço, saudável, ainda mandaste os lanches da manhã e da tarde, deste banhos, fizeste o jantar, passeaste o cão, estudaste com um, brincaste com outro, leste histórias antes de dormir, beijaste-os até te mandarem embora por já não aguentarem de tanto rir. Caramba. És incrível.

E depois há os outros dias.

Os dias em que não acordas tão bem disposta e, mesmo sem dares por isso, já estás a enviar energias negativas pelo ar. Talvez seja o tom com que os acordas, um "bom dia" acre e não doce, talvez seja o modo como lhes tocas para que abram os olhos, alguma rispidez na forma como os resgatas do sono. Ou então a culpa não é tua. São eles que não estão tão bem dispostos, não dormiram bem, não dormiram tudo, não sabes. Sabes que te recebem com duas pedras na mão, que se recusam a levantar, que rosnam ao pequeno-almoço, que fazem fita para tudo, e que tu sem saber como já estás aos gritos, a ser uma pessoa horrível, a pessoa que menos gostas de ser na vida, uma megera. O caminho para a escola é feito sem vontade, estás zangada com eles, estás zangada contigo por teres perdido as estribeiras, sentes-te uma merda de mãe. És má mãe. Que raio de mãe grita assim com os miúdos, que raio de mãe não percebe que estão cheios de sono, que são pequenos, que não têm de se portar como adultos? Que raio de mãe és tu? Entrega-los na escola com um beijo seco, outras vezes tentas um abraço conciliador (sem grande sucesso porque soa a forçado), e vais em lágrimas pelo caminho. Ainda que o resto do dia seja perfeito, a manhã já foi um pesadelo. Já ninguém te tira o mal-estar de teres falhado. E é então que pensas que, ao final do dia, tens de ser melhor. Afinal, tu és melhor do que aquilo. O final do dia será a tua oportunidade de reparar o que correu mal. Limpas as lágrimas e prometes que terás toda a paciência do mundo. Mesmo que não queiram tomar banho, fazer os trabalhos, estudar, mesmo que dêem uma bolada que dê cabo de alguma coisa de que gostes, mesmo que esperneiem, mesmo que tragam uma falta disciplinar, mesmo que te dêem uma resposta torta, tu serás a mãe calma, ponderada e amiga que não foste de manhã. Porque há sempre uma nova oportunidade para seres melhor. E isso consola. Ainda que não te apazigue porque, bom mesmo, era se fosses sempre perfeita.  

 

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